O Major Manoel Medeiros

Silvério Ribeiro

 

Manoel Antônio de Medeiros, major provisionado da Capitania de Minas Gerais, morava no Arraial da Igreja Nova da Borda do Campo. Sob os auspícios de Nossa Senhora da Piedade, padroeira do arraial, e a pedido da mulher, devota da sofrida mãe do Cristo Redentor, deixou, em 1778, a velha Fazenda da Ressaquinha, herança de família, que arrendou conseguindo recursos para construir sua casa na nova vila que se formava no alto da Serra da Mantiqueira. Ali, deu continuidade ao seu trabalho de fabricação e venda de artigos de couro. 

O major comerciante construiu uma grande casa de porta e janela para moradia e duas grandes portas para comércio. Na residência abrigava, além da esposa, uma filha casada com três filhos e outra viúva com dois filhos. Somava aos agregados um genro preguiçoso que vivia do mascate e três escravas moças, irmãs de um negro forte e parrudo, ferrador de cavalos e capanga do velho Manoel. As portas de comércio abertas o dia todo, além do major ali sempre presente, ficava sentado a uma cadeira de palhinha à frente de uma velha mesa de madeira de grossas pernas, um velhote de cabelos grisalhos e encaracolados, sempre escriturando mercadorias e recebendo os valores da venda. Este era o Sr. Popó, Paulino Dias dos Santos, cunhado do major, seu sócio.

 O que possuía Manoel Medeiros de impaciência, rompante e desorganização, encontrava no cunhado o inverso, a prudência, o comedimento e a meticulosidade. Manoel era de falar aos brados, aos berros. Popó conversava baixo, às vezes parecia cochichar. O velho major era brigão. Popó, o apaziguador. Manoel era da cachaça, do jogo, da risada estridente. Paulino era abstêmio. O major fumava desbragadamente. Popó, uma pitada de fumo uma vez ou outra a cada mês. O major era alto, forte, estilo bonachão, a barba sempre grossa. Paulino era franzino. Manoel andava o dia todo sujo acompanhando o descarregamento das carroças de couro e ajudando mestres que contratava conforme demanda na fabricação de artefatos. Paulino, esmerado no trajar, roupa limpíssima, de ternos de bom talhe, cabelos empoados, cara escanhoada com capricho. O major gostava de pilheriar que o cunhado era quase uma mulher. Popó recebia a gozação com um sorriso de indiferença. Eram amigos de verdade. O rompante do Major Manoel era a energia que fazia dele um próspero empreendedor. A prudência do Sr. Popó, o equilíbrio para administrar os negócios. Esta balança garantia dinheiro para uma vida melhor do que as demais da vila, dinheiro mesmo para fazer do major um dos homens mais bem-sucedidos da região e respeitado por todos.

 

O Major Manoel Medeiros é um dos personagens do romance O Brasileiro de autoria de Silvério Ribeiro