Padre-Mestre José Joaquim Correia de Almeida

José Joaquim Correia de Almeida, nascido em 4 de setembro de 1820, na vila de Barbacena, é o primeiro dos escritores barbacenenses sobre os quais falaremos em nosso projeto. Filho do major Fernando José de Almeida, um dos que solicitaram a elevação do Arraial da Igreja Nova da Borda do Campo à categoria de vila ao visconde de Barbacena, então governador da capitania das Minas Gerais, Correia de Almeida iniciou seus estudos ali mesmo. Porém, antes dos quinze anos de idade, mudou-se para São João Del Rei, com o objetivo de realizar os estudos preparatórios necessários para o ingresso nas academias do Império.
Correia de Almeida cresceu e foi educado em um momento notável da história do país. Nesse período, a atmosfera política brasileira estava muto movimentada, devido à recente proclamação da Independência do Brasil.
Esse foi um ambiente propício para o desenvolvimento de uma literatura nacional, construída com base nos ideais de liberdade que dominavam a Europa, ocasionados principalmente pela Revolução Francesa, no fim do século XVIII. Era o início do Romantismo em terras brasileiras. Obviamente, o jovem padre foi influenciado por esse clima que, apesar de revolucionário, não rompeu totalmente com a tradição clássica (pelo menos não na primeira metade do século XIX), que ainda era ensinada nas escolas e considerada literatura erudita. Porém, nesse contexto pré-romântico, as formas clássicas deixaram de ser uma obrigação, tornando-se uma questão de escolha, preferência de cada escritor. [1] A poesia satírica, gênero adotado por Correia de Almeida, era característica do século anterior, mas ainda teve seu prestígio na época do poeta, que se considerava “sectário da antiga escola do século que passou”. [2]
Em 1841, Correia volta a Barbacena e inicia os estudos sacerdotais. Seu mestre era Joaquim Camilo de Brito, um vigário um tanto quanto revolucionário, que se dedicou mais à carreira política do que à eclesiástica. Pode-se concluir que o futuro Padre Mestre Correia também adquiriu esse espírito rebelde, devido à falta de maior rigor em sua preparação para a vida sacerdotal. Foi ordenado padre em 3 de março de 1844, realizando sua primeira missa em 21 de abril do mesmo ano, em Barbacena. Apesar de ser um grande defensor da moral cristã, “possuidor de um profundo sentimento religioso”, como diz a pesquisadora Maria Marta Araújo no livro Com quantos tolos se faz uma república?: Padre Correia de Almeida e sua sátira ao Brasil oitocentista, obra base de nosso estudo sobre o autor, nunca foi de fazer discursos ou pregar sermões. Escreveu:

“- Não te demoras na Igreja,
quando o orago se festeja!
Pois não gostas de sermão?!
– Se ser mão sempre assim é,
Senhor Padre Capelão,
eu antes quero ser pé!”

“Sabeis, meu Padre Cura,
que vos dera Jesus este árduo e grão preceito:
– predicai o Evangelho a toda a criatura!
E é tanto o vosso jeito,
Que mártir há de ser cristão que vos atura!”

“Há seus bons três quartos de hora
Frei Soeiro está no altar,
e o pecador que a Deus ora
não se pode levantar!
Só porque diz um Missão,
o padre cumpre a missão?” [3]

Preferia condenar os costumes e excessos de sua sociedade através do uso da ironia, motivo pelo qual era um partidário da sátira, assim como vários outros clérigos, fato interessante de se observar. Por servir como meio não só de indicar, mas de corrigir os males sociais e políticos, sempre presentes em todas as sociedades de todas as épocas, a sátira é um gênero que não se torna ultrapassado, conservando seu espaço no século XIX, principalmente na imprensa, apesar de perder sua popularidade a partir da segunda metade do Oitocentos. A veia moralizante do gênero satírico explica a sua adoção por vários padres mineiros, entre eles Correia de Almeida, que, segundo Camilo Castelo Branco, famoso escritor português, tinha “mais confiança no epigrama que no Sermão da Montanha; e que, tendo de escolher companheiro de missão preferia Juvenal a S. Paulo”. [4]
A divulgação literária nesse período era feita principalmente pelos periódicos em circulação no país. Por essa razão, é muito difícil separar literatura de imprensa e política quando se consideram as primeiras décadas do século XIX. Os jornais e revistas eram os principais cultores de ideias revolucionárias, sendo os textos literários, portanto, muito influenciados por esse meio, ocorrendo então a quebra de padrões estéticos clássicos (o soneto, por exemplo), o que, acreditava-se, limitava a liberdade dos autores. No período do Arcadismo, imediatamente anterior, isso servia como uma “fôrma” de produzir poemas, que não permitia a completa expressão dos sentimentos e ideias, principalmente dos novos ideais oitocentistas, ponto essencial para os escritores românticos. Escreveu Correia de Almeida, em 1858:

“Ser bom poeta é facílimo;
o ponto está em achar-se
o segredo de imitar-se,
sob a capa do disfarce,
o que os outros disseram,
o que os outros fizeram.

[…]

Faria logo um soneto,
em que rimasse memória
naturalmente com glória,
com história e com vitória;
por que assim contemplo
de Bocage exemplo.”

Nesse contexto, o padre Correia começa a escrever poemas satíricos para diversas publicações, que mais tarde, em 1854, seriam reunidos no primeiro volume de Sátiras, epigramas e outras poesias.